pagu

(biografia)

 

1936. Pagu é presa novamente...

Sua irmã Sidéria conta: “...Como eu disse, depois que entregamos o Rudá para o Oswald, continuamos, eu e a Pat, morando na Rua dos Andradas, ela trabalhando na “Platéia”, eu, na escola, até o dia 27 de novembro, que foi o dia do golpe, não é, e eu sabia que ia haver alguma coisa e fiquei esperando a Pat feito uma doida, fui na “Platéia”, procurei por todo o canto e não encontrava mesmo; daí eu resolvi voltar pra casa e quando foi mais ou menos 11 da noite, ela chegou e disse: bom, a gente tem que sair porque está determinado que a gente tem que estar na rua hoje, nós estamos escaladas pra ficar em tal lugar, parece que era a Av. São João. Então nós saímos, vestidas, preparadas pra guerrilha – ai, que ridículo! – fazer a revolução com estilingue. E veio um camburão da polícia acompanhando a gente. Então entramos no Bar Natal, na Av. São João, ela estava cheiíssimo e nos sentamos numa mesa e os tiras entraram também, então diversas pessoas avisaram, jogando bolinha de papel escrita em cima da mesa e tudo, mas o bar foi esvaziando. E daí a gente não tinha outro jeito, não podia ficar lá, não, porque ia ser fogo, não é, então a gente saiu, subiu a ladeira São João, acompanhada, e naquele tempo tinha ali, do lado do Martinelli, um ponto de táxi, a gente passou e falou pro motorista “bota o carro em movimento”, e os tiras passaram, a gente voltou, tomou o táxi e saiu, se mandou, daí foi uma perseguição cinematográfica, engraçada pra burro, saiu um carro, outro carro, bom, e a gente despistou os caras e nós apelamos pro papai, e ele levou a gente pra casa de um primo onde  passamos a noite.

Depois disso nós fomos pra casa de um motorista da Light, português, que era na rua Ibituruna, no Jabaquara – esse motorneiro depois foi preso, foi expulso. E depois a gente passou a morar lá, de qualquer jeito, em qualquer lugar, onde dava jeito, e estava tudo errado, e daí eu arranjei um quarto no Largo Colombo e perdi um pouco de vista a Pat. E um dia eu sai para ter um contato qualquer e fui presa. E a Pat continuou solta. Eu fui pro Presídio Paraíso, e fiquei lá, torcendo pra Pat não ser presa, mas não demorou muito, ela foi presa também. Daí, foram anos de Presídio Paraíso, Maria Zélia....”


1940. King Shelter - mais um pseudônimo usado por Pagu

 

 


 

Pagu com Geraldo Ferraz, seu marido e seu segundo filho Kiko

Passada a fase panfletária e de militância política, a história de Patrícia Rehder Galvão, ficou marcada pelo processo de profissionalização no jornalismo. Em 1942, casada com Geraldo Ferraz, foi redatora de A Manhã e de O Jornal, no Rio, e de A Noite, em São Paulo. Sempre acumulando mais que um emprego, em 45 a jornalista trabalhou na agência de notícias France Presse, editou com a colaboração de Geraldo Ferraz a Famosa Revista e integrou a redação do Vanguarda Socialista. No Vanguarda publicou apenas um artigo político e muitas crônicas literárias. "Naquela época, jornalista já não podia ter um emprego só". conta Geraldo Galvão. Ainda nesse período de 45 a 50, marcado por intensa atividade jornalística, Patrícia passou pelos jornais: o italiano Fanfulla, O Tempo, Jornal de São Paulo e Diário de São Paulo. O jornal Diário de São Paulo viveu uma fase de pauta de alto nível, com a colaboração de Patrícia e Geraldo Ferraz. O Suplemento Literário que editavam levava semanalmente até seus leitores autores inéditos, nada menos que James Joyce, Mallarmé, Kafka, entre outros. "Patrícia escrevia uma biografia crítica e publicava trechos de cada autor. É a primeira vez que sai um texto de Ulisses no Brasil", conta ele.


1945. É candidata a deputada estadual. Não é eleita

 

 

 

 


 

Trecho da carta para Geraldo Ferraz, escrita quando esteve presa na Casa de Detenção de São Paulo.


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

              Por seu ideal político, foi presa mais de 20 vezes!

 

 

 

 

 

 

 

 

Com grupo teatral na intensa vida cultural de Santos-SP

A importância de Pagu na vida cultural da cidade de Santos-SP foi tão grande que foi fundadora da Associação dos Jornalistas Profissionais e a primeira presidente da União de Teatro Amador da cidade. Ela levou para Santos mais de 1200 participantes para o 2º Festival de Teatro Amador e traduziu para o teatro a peça de Ionesco, "A cantora careca". Dirigiu e também traduziu a peça de Arrabal "Fango e Lis" (59) com um grupo amador (essa peça teve estréia mundial em Santos, sendo vista até em Paris), ficando mais de dez anos em cartaz.

 

 

 

                                         12 de dezembro de 1962. Morre Patrícia Rehder Galvão - a Pagu

“Deu-se esta semana uma baixa nas fileiras de um agrupamento de raros combatentes. Ausência desde 12 de dezembro de 1962, que pede seu registro do companheiro humilde, que assina estas linhas. Patrícia Galvão morreu neste dia de primavera, nessa quarta-feira, às 16 horas (...) Morreu aqui em Santos, a cidade que mais amava, na casa dos seus, entre a Irmã e a Mãe que a acompanhavam, naquele momento e, felizmente, em poucos minutos, apenas sufocada pelo colapso que a impedia de respirar, pela última palavra que pedia ainda liberdade, ‘desabotoa-me esta gola’”. (Geraldo Ferraz, A Tribuna, 16/12/1962)

 

 

Bilhete para Oswald de Andrad—1930

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

"Sairás pelo meu braço grávida, de bonde/
Teremos seis filhos/E três filhas/ E nosso
bonde social/
Terá a compensação dos cinemas/ E dos aniversários dos bebês/Seremos felizes
como os tico-ticos/ E os motorneiros/
E teremos o cinismo/ De ser boçais/Como os demais/ Mortais/ Locais"

Oswald de Andrade

 

 

              "Dentro desta mulher, longe de condicionamentos e repressões estéticas, literárias, sexuais, sociais e culturais, topamos com a leveza dos traços, quase infantis, característicos de uma Arte Moderna, que retratam a sensibilidade de sua alma".

Maria Lúcia Teixeira Furlani

 

           Pagu foi pioneira nas idéias e na ação, transcendeu seu tempo, por ousar sofreu, sentiu ostracismo, foi perseguida, presa, torturada, não se vergou, não se entregou. Somente a doença venceu-a. A vida do espírito, porém, desconhece a morte. Fez história. É sanjoanense.”

Maria Célia de Campos Marcondes

 

           Pagu é patronesse da Cadeira nº  36, da Academia de Letras de São João da Boa Vista, cuja titular é Maria Inês Araújo Prado.


NOTHING

Nada nada nada
Nada mais do que nada
Porque vocês querem que exista apenas o nada
Pois existe o só nada
Um pára-brisa partido uma perna quebrada
O nada
Fisionomias massacradas
Tipóias em meus amigos
Portas arrombadas
Abertas para o nada
Um choro de criança
Uma lágrima de mulher à-toa
Que quer dizer nada
Um quarto meio escuro
Com um abajur quebrado
Meninas que dançavam
Que conversavam
Nada
Um copo de conhaque
Um teatro
Um precipício
Talvez o precipício queira dizer nada
Uma carteirinha de travel's check
Uma partida for two nada
Trouxeram-me camélias brancas e vermelhas

Uma linda criança sorriu-me quando eu a abraçava
Um cão rosnava na minha estrada
Um papagaio falava coisas tão engraçadas
Pastorinhas entraram em meu caminho
Num samba morenamente cadenciado
Abri o meu abraço aos amigos de sempre
Poetas compareceram
Alguns escritores
Gente de teatro
Birutas no aeroporto
E nada.

Pagu/Patricia Rehder Galvão
Publicado n'A Tribuna, Santos/SP, em 23/09/1962

(1910-1930)     (1931-1935)     (1936-1962)     (cronologia)    (bibliografia)    (pagu em são joão)

Em apenas seis meses - de junho a dezembro de 1944 -, o escritor King Shelter tornou-se um fenômeno entre os fãs brasileiros de literatura policial, que compravam os exemplares da revista Detective em busca de seus contos. Da mesma maneira que surgiu - repentinamente -, Shelter desapareceu. Os nove contos escritos para Detective (revista dirigida por Nelson Rodrigues), um dos mais bem-sucedidos exemplos da literatura pulp fiction no Brasil, jamais foram reeditados. 54 anos depois King Shelter reaparece. E, como em um bom enredo policial, sua identidade é finalmente revelada: King Shelter foi o pseudônimo usado por Patrícia Galvão.

No ano de 1945, publica seu segundo romance, A Famosa Revista, no qual denuncia os males de um partido (PCB) monolítico. De 46 a 48, passa a escrever no suplemento literário de O Diário de São Paulo. Ao mesmo tempo em que lança o histórico manifesto Verdade e Liberdade, concorre a uma cadeira à Assembléia Legislativa de São Paulo, pelo Partido Socialista Brasileiro, em 1950. Ela ainda faz uma última tentativa de resgatar sua militância política.Concorreu à Assembléia Legislativa, mas seu discurso acabou não agradando. Nele ela revelava as condições degradantes que foi submetida, que seus nervos e inquietações acabaram transformando-a "numa rocha vincada de golpes e amarguras, mas irredutível". Não consegue se eleger.

    VOLTA      SEGUE

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